sexta-feira, 11 de março de 2016

Salões de Paris

Design de Tereza Bettinardi
Salões de Paris
Autor: Marcel Proust
Designer: Tereza Bettinardi
Editora: Carambaia
Acabamento: hot-stamp dourado.

Antes de se tornar o autor consagrado de Em busca do tempo perdido, Marcel Proust, como tantos escritores de sua época, passou pelo jornalismo. Foi nos periódicos franceses que publicou seus primeiros textos: crônicas em que descreve os salões parisienses – espécies de saraus literários e musicais, frequentados por aristocratas e gente da alta sociedade da época –, críticas de moda, arte e literatura, além de textos inspirados na atualidade política e até policial.

Editado pela Carambaia, numa edição em capa-dura com lombada dourada, o projeto gráfico é de Tereza Bettinardi e tem uma tiragem numerada de 1000 exemplares. São 21 crônicas escritas por Proust e publicadas na imprensa francesa, principalmente no jornal Le Figaro, mas também em periódicos de curta duração como o Le Mensuel (que circulou entre outubro de 1890 e setembro de 1891) ou revistas especializadas, como a Revue d’Art Dramatique (1886-1909) ou a Revue Blanche (1889-1903). O projeto gráfico do livro é da designer gaúcha Tereza Bettinardi, cuja entrevista a esse blog segue abaixo:


Como você se tornou designer de livros?
Apesar de sempre trabalhar com design editorial – primeiro na Editora Abril e depois no Máquina Estúdio, com Kiko Farkas – considero que aprendi mesmo a fazer livros durante o tempo que trabalhei na Cosac Naify. Foram dois anos de aprendizado intenso, uma experiência muito rica de troca, onde eu entendi o processo e os caminhos do livro.

Como fato curioso, lembro que durante a entrevista com Elaine [diretora de arte da Cosac Naify], enquanto analisava o meu portfolio [que consistia basicamente de revistas e outras publicações, mas poucos livros], ela fez o seguinte comentário e pergunta: seu trabalho explora a tipografia com um volume muito alto, você estaria disposta a trabalhar com livros onde a tipografia é um pouco mais silenciosa? Na hora respondi algo que carrego comigo até hoje: cada projeto é uma pergunta e se até o momento respondi daquela forma mais é porque as perguntas me guiavam para aquele caminho.


O que você acredita que faz de uma capa uma boa capa?
Gosto de pensar a capa [não só a capa, mas o projeto gráfico do livro como um todo] como um encontro. Um encontro do autor, designer, editor, leitor. O sucesso dela depende disso. Como designer, penso que ela precisa despertar a curiosidade do leitor e trazer um pouco do universo da história.

Primeira versão aprovada da capa
Como foi o processo criativo para se chegar nessa capa?
Já tinha feito dois outros projetos – um pessoal e outro encomendado pela Companhia das Letras – com o uso de padrões e ornamentos. Não sou pesquisadora ou expert no assunto, mas gosto muito de incorporar pesquisas pessoais em projetos assim. Logo depois da primeira reunião com os editores e tradutores deste livro, fiquei por dias no acervo digital da Biblioteca de Paris pesquisando edições anteriores dos livros do Proust. Até aí nada demais, mas a partir daí fiz uma extensa pesquisa de objetos art nouveau. Aí me veio a ideia de que este livro poderia ser todo dourado... com um padrão simples, mas que cobrisse toda a capa. Então na verdade, respondendo a tua pergunta, acho que a capa foi resultado do pensamento do livro todo, quando eu comecei a pensá-lo como um objeto.

Lembro que na primeira apresentação [ver imagem acima], mostrei uma versão em que misturava letterpress com estes ornamentos. A tipografia era mais agressiva, na época pensei que poderia ser interessante este contraste e como todos os textos selecionados tinham sido publicados em jornais, achei que cabia. Lembro que a capa já tinha sido aprovada com uma certa antecedência... mas logo depois de aprovada, fiquei achando que ela precisava de um tempo para amadurecer e deveria olhar para ela com os olhos mais frescos na finalização. Algo me dizia que ainda não tinha chegado no melhor resultado. Até que dois meses depois da aprovação, voltei e achei que era a chance de refazer o desenho da capa. Fiquei até receosa por dar este passo para trás e correr o risco dos editores não aprovarem, mas achei melhor arriscar. Foi então que entendi que deveria partir para algo mais elegante e a opção pelo lettering vertical surgiu como uma consequencia deste raciocínio. Fiquei feliz por contar com este tempo de "amadurecimento".

Houve alguma dificuldade a ser contornada, em termos de produção gráfica ou design?
Sim. Algo bem simples na verdade. A ideia é que a lombada do livro fosse feita de tecido, no entanto a produção gráfica me aconselhou a desistir da ideia em função do acabamento [o tecido poderia desfiar no corte trilateral].
Houve uma etapa de preparação antes de começar o projeto em si?
Além da pesquisa e da leitura dos textos do livro, lembro que assisti um documentário sobre o Proust e ouvi um podcast sobre Belle Epoque. Gosto deste mergulho, quanto mais fundo melhor... no entanto, às vezes nem sempre é possível.
O que você diria que faz essa capa funcionar, que faz ela ser o que é?
Eu acho que esta capa chama atenção [por incrível que pareça!] pela simplicidade. A ideia do ornamento composto só pelo semi-circulo e as diferentes combinações, a sobreposição de elementos, a simplicidade de cores. O material também traz um certo interesse: papel holler preto + serigrafia + hot stamping. Acho que estas diferentes texturas somaram ao projeto.

Tereza Bettinardi é graduada em Desenho Industrial/Programação Visual pela Universidade Federal de Santa Maria (RS). Em 2006, mudou-se para São Paulo onde começou a trabalhar na Editora Abril como designer em diversas revistas, entre elas Superinteressante e Capricho. Integrou as equipes de design do Máquina Estudio/Kiko Farkas e da Cosac Naify. Dentre os inúmeros projetos na editora, foi laureada com um Jabuti pelo projeto gráfico do livro Decameron de Giovanni Boccaccio desenvolvido em conjunto com Elaine Ramos. Foi professora visitante do módulo da pós-graduação no curso de design editorial do Istituto Europeo di Design em São Paulo em 2014 e atualmente é professora convidada do Curso de Especialização em Design Gráfico na Unicamp. Foi residente do Curso de Escrita e Crítica em Design na School of Visual Arts em Nova York. Atualmente trabalha como designer independente desenvolvendo projetos para diversas editoras.
 

2 comentários:

Marcelo disse...

meu comentário é apenas que passou um Teresa com S. abs!

Samir Machado disse...

Opa, obrigado, Marcelo. Já corrigido.

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